A intolerância política ainda fere Angola

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Luís de Castro
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OPINIÃO


Luís de Castro/ Presidente do Partido Liberal


Tenho acompanhado com enorme preocupação os recentes actos de intolerância política ocorridos na Galanga, província do Huambo, onde militantes — incluindo o secretário provincial do Galo Negro — foram gravemente feridos. Este episódio, infelizmente, é mais um reflexo de uma ferida histórica que continua aberta na sociedade angolana.

Constata-se que os dois principais partidos históricos — o MPLA e a UNITA — ainda não realizaram uma leitura profunda da sociologia política de Angola. Parece não haver, de parte a parte, uma preocupação genuína com o passado sombrio das suas ações durante o período de guerrilha. É como se a reconciliação nacional fosse apenas um discurso formal, e não uma prática viva no quotidiano político.

Nas vésperas das eleições de 2022, enquanto presidente do Jango Cultural, associação cívica dedicada à promoção dos direitos humanos e da convivência pacífica, desloquei-me ao município do Tchinjenje, com o propósito de mediar um ambiente de forte tensão política. Famílias estavam a se desestruturar por causa da disputa em torno de símbolos partidários. Um grupo de jovens queria içar bandeiras da UNITA em algumas comunas, mas outro grupo opunha-se, justificando que, durante a guerra, naquela zona, a UNITA foi responsável por inúmeras mortes.

Ainda vivemos esta triste realidade: em algumas zonas do país, o MPLA não pode organizar livremente a sua militância, e noutras a UNITA encontra obstáculos semelhantes. Esta intolerância agrava-se sempre que nos aproximamos de períodos eleitorais.

Precisamos urgentemente de reeducar os nossos cidadãos, promover o diálogo interpartidário e consolidar uma verdadeira cultura de paz. A democracia não se mede apenas pelo número de partidos ou pelo calendário eleitoral — mede-se, acima de tudo, pela capacidade de convivência entre diferentes visões políticas num mesmo espaço social.

É tempo de transformarmos a memória da guerra em lição de reconciliação, e não em combustível para novos conflitos. A paz só será verdadeira quando cada angolano se sentir livre para expressar a sua opinião e exercer a sua cidadania sem medo — seja qual for a sua cor partidária.


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